Inovação |
Realidade virtual mista na cirurgia do ombro Por Luciano Pascarelli |
A tecnologia digital, ao longo dos últimos anos, vem revolucionando os sistemas de saúde com o desenvolvimento de novas técnicas para diagnóstico e terapias. Essas soluções digitais estão mudando a prática médica com um potencial tecnológico disruptivo nas mais diversas áreas médicas, particularmente na cirurgia. A tecnologia chamada de “realidade virtual”, já presente no nosso dia a dia até mesmo em jogos de computador, tem sido utilizada na área ortopédica em diversas situações, como no ensino, treinamento, programação pré e intraoperatória e em vários procedimentos, auxiliando, por exemplo, no posicionamento de implantes, realização de osteotomias e cirurgias oncológicas, permitindo cirurgias com participação de outros cirurgiões à distância. Especificamente, essa tecnologia é classificada como realidade aumentada, realidade virtual ou mista. A realidade aumentada proporciona uma visão estereoscópica, isso é, uma visão de volume que é sobreposta a volumes reais, como, por exemplo, visibilizando de forma tridimensional, com o uso de um smartphone ou tablet, uma imagem anatômica sobreposta a um paciente. Por outro lado, na realidade virtual, há uma imersão total em um ambiente totalmente virtual, a exemplo dos jogos de computador, podendo ser utilizada no ensino e treinamento de procedimentos ortopédicos. A realidade virtual mista, por sua vez, é a mais recente e sedutora, associando a fusão do mundo “real” e virtual, isto é, conecta ambientes totalmente virtuais ao ambiente real. Modelos anatômicos podem ser criados a partir de arquivos DICOM, provenientes de métodos de imagem convencionais. Essa tecnologia permite que o usuário interaja com o mundo “real” e virtual de forma integrada. Para isso, o cirurgião faz o uso de um “headset” específico, composto por várias câmeras que sincronizam os movimentos oculares, permitindo que o usuário visibilize e manipule os volumes tridimensionais formados (hologramas). Tem a vantagem de fornecer ao cirurgião uma imagem tridimensional verdadeira da anatomia do paciente, muito superior a imagem bidimensional gerada na tela do computador por exames de imagem ou softwares específicos. Vários artigos na literatura estudam a validação desse método, como por exemplo no artigo “Applications of Mix Reality Technology in Orthopedics Surgery: A Pilot Study” Lu et al, 2022, onde os autores concluem que o uso da realidade virtual mista reduz a dependência da experiência do cirurgião, proporciona uma visão personalizada da anatomia do paciente e mostra direção em sentido de um futuro promissor com uso dessa tecnologia. Já no artigo “Surgery Guided by mixed reality: presentation of a proof ofConcept” Gregory et al utilizam do uso da realidade mista para a colocação de prótese reversa de ombro e não relatam aumento de tempo cirúrgico e nem aumento do risco de contaminação, além de permitir contato com outros cirurgiões de fora do país durante o procedimento. No nosso meio, o Grupo de Ombro da Escola Paulista de Medicina, em associação com a Universidade Commonwealth da Virginia, desenvolve um programa para uso dessa tecnologia nas artroplastias do ombro. Essa técnica foi utilizada em conjunto em uma artroplastia reversa no serviço do Hospital IFOR, para otimização do posicionamento do componente glenoidal em um caso com desgaste severo da glenóide (cirurgia realizada pelos doutores Nicola Archetti Neto e Roberto Rnagel Bongiovanni). Essa é uma tecnologia que se encontra na fase inicial, e novos estudos podem demonstrar seu uso e benefício na artroplastia do ombro.
Durante cirurgia no Hospital IFOR - Rede D'Or São Luiz, Dr. Nicola usa o holograma após programação pré-operatória para posicionamento do componente glenoidal. À esquerda, imagem da escápula e o posicionamento do fio de kirschner central. À direita, o uso dos óculos holográficos pelo Dr. Nicola. Holograma de uma figura de ombro com planos de orientação sob o comando do cirurgião. |
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